O mergulho em naufrágios é sempre um mergulho
diferenciado. Especial pelos cuidados necessários; romântico, por suas
histórias (quando ainda navegando), e mágico, em virtude de toda a vida que
aflora a cada centímetro visitado. Cada um tem sua magia, seus encantos. Não é
diferente quando falamos do Contra Torpedeiro Paraíba - D 28 ou simplesmente CT
Paraíba.
Construído pelo estaleiro Avondale de New Orleans, em
dezembro de 1965 o navio da classe Garcia passou a integrar a esquadra
americana (U.S.Navy) sendo comissionado como Destroyer Scort 1045 na Carolina
do Sul. Foi batizado U.S. Davidson em homenagem a um oficial de destaque da
marinha americana durante a 2ª grande guerra. Em abril de 66 o U.S. Davidson
passou a servir no porto de Pearl Harbour. Nos nove anos seguintes passou a
operar como suporte de artilharia naval no Vietnam e sudeste Asiático. Sua
especialidade foi o combate a submarinos.
A excelência de seus artilheiros
rendeu-lhe inúmeros prêmios e condecorações. Em 1988 encerrou sua carreira nos
Estados Unidos. Em abril de 1989 passou junto com três outros “irmãos” da
classe Garcia, a integrar a Marinha Brasileira. Em dezembro deste mesmo ano
aportou no Rio de janeiro, já com seu novo nome, Contra torpedeiro Paraíba. Sua
baixa ocorreu no ano de 2002, permanecendo no arsenal de marinha até que em
2004, após ter sido arrematado em um leilão para desmonte por uma empresa
Liberiana, acabou naufragando durante seu reboque para a cidade de Aland/Índia.
O CT Paraíba encontra-se naufragado próximo às ilhas
Tijucas, em profundidades entre 54m e 39m (sua antena). À exceção de sua proa,
que se apresenta torta à boreste, em virtude do impacto com o fundo, sua
estrutura encontra-se íntegra. Canhões, lançadores de mísseis e torpedo e o seu
hangar são uma atração especial para os mergulhadores técnicos que se aventuram
neste mergulho. Bastante inclinado, com algumas portas abertas e suas antenas
destacando-se nas partes mais rasas, 40m, este mergulho deve ser cuidadosamente
planejado em virtude da grande quantidade de cabos, linhas de pesca e uma rede
de arrasto presa ao navio (o que assombra esta aventura).
Minha primeira ida ao CT Paraíba, como não podia
deixar de ser, foi
coordenada pelo Comandante Basílio, um especialista neste
naufrágio com mais de 60 mergulhos logados somente no local. O apoio técnico
ficou a encargo da equipe da Divers Quest, operadora carioca com mais de 15
anos de experiência no mercado. Nosso deslocamento, nesta mega operação de 12
mergulhadores, foi realizado por duas embarcações. Cilindros, lastros e demais
equipamentos foram levados da marina da Glória até o local pelo “Velho
Marinheiro”, enquanto nós, mergulhadores, partimos cerca de duas horas depois,
a bordo na Anakin, embarcação do Cmte Basílio que vem operando os mergulhos no
local.
A 22 nós de velocidade, em um dia de “mar de
almirante”, vivemos 45 minutos de espectativa após um detalhado briefing,
ilustrado com croquis e fotografias de um irmão gêmeo do D 28.
Analisamos o diagrama do navio tentando imaginá-lo em
uma inclinação superior a 50º. Fomos
alertados para o perigo dos cabos, linhas de pesca e de uma enorme e medonha
rede de arrasto perdida por um navio pesqueiro há alguns anos. Nosso
Comandante, em virtude sua experiência em navegação e familiarização com o
local, ferra, sempre na primeira tentativa, onde quer. Ele nos disse que poria
o ferro mais para a popa e prometeu o hélice e o hangar como atração principal.
Com o auxílio do Marcão, seu marinheiro, estávamos
prontos para o mergulho. Devidamente equipados, munidos de cilindros duplos,
computadores, facas, lanternas, deco marker, carretilhas e stages de EAN 40
(como travel gas) e paradas descompressivas mais fundas e O2 para aceleração da
descompressão nas paradas aos 6m e 3m, lançamo-nos dois a dois rumo ao mais
deslumbrante mergulho em naufrágio na costa carioca.
Em pouco mais de dois minutos, com uma sorte muito
grande, o que encontramos foi uma água extremamente clara, roxa, e visibilidade
deslumbrante. Já do cabo de descida se podia ver o naufrágio em toda magnitude
de seus 127m de comprimento. Nossa visibilidade, inexplicavelmente, beirava os
20 metros e surpreendentemente a corrente no local era pequena. Cabe ressaltar
que estas não são as condições normais deste mergulho que costuma apresentar
baixa visibilidade, às vezes 2m, e muita correnteza.
Mas o Grande Arquiteto do Universo, neste dia, estava
com vontade de nos premiar e junto a tudo isto ainda nos mandou um grande
cardume de enxadas, mais de 300, e outro de badejetes, um deslumbre...
O naufrágio é deslumbrante, sua estrutura intacta tira-nos
da realidade induzindo-nos a uma inebriante viagem durante os 30 minutos de
fundo que nosso planejamento nos permite. Aos 28 min, sob o comando de nosso
sicerone partimos em direção ao cabo, rumo aos nossos próximos 40 minutos entre
subida e descompressão. Foi com um misto de tristeza e satisfação que
abandonamos esse monumento submerso, uma sensação que, infelizmente, poucos
ainda estão capacitados tecnicamente a experimentar...
Como era nosso dia de sorte, aos 3 metros, em nossa
última parada (cerca de 16min) uma rêmora perdida, juntou-se a nós,
circundando-nos a poucos centímetros insistentemente, como se quizesse grudar
em nossos trajes...
De volta a Anakin, Marcos Adriano, o marinheiro, nos assessorou
no recolhimento do equipamento e subida na embarcação. Pronto, só nos restou
apreciar a viagem de regresso, comentanto os vistos e os não vistos detalhes do
CT, premiando este feito com um almoço no Iate Clube Rio de Janeiro.
Missão cumprida e a certeza de que deste dia em
diante, será difícil recusar o semanal convite de retorno ao CT Paraíba à bordo
da Anakin.
:.Paulo Cid
Instrutor PADI #240096
Fotos: Cmte Basílio e Paulo Cid
Nenhum comentário:
Postar um comentário